viernes, marzo 20, 2009
EUA e Brasil em lua de mel, mas sem álcool
EUA e Brasil em lua de mel, mas sem álcool
Agenda entre os dois países vai além do comércio, e envolve novo papel na América Latina
Por Patrick Brock
The Wall Street Journal, de Nova York
Numa reunião na Câmara de Comércio de Nova York, em 2 de novembro de 1863, o pastor James Cooley Fletcher se desdobrou para convencer os empresários locais sobre a importância de estreitar os laços com o Brasil, segundo registro de um jornal da época. Acompanhado dos diplomatas brasileiros Joaquim de Azambuja e Luis Fleury, que traziam uma elogiosa carta da Câmara de Comércio do Rio de Janeiro, Fletcher, um entusiasmado brasilianista, celebrava o início da primeira rota direta de vapores entre as duas principais cidades das jovens nações, Rio de Janeiro e Nova York.
Da pequena frota de vapores subsidiados pelos governos dos dois países, as relações comerciais entre o Brasil e os Estados Unidos evoluíram desde então para uma balança comercial de pouco mais US$ 53 bilhões em 2008, com saldo positivo de US$ 1,8 bilhão para o Brasil. O diálogo transnacional também passou para esferas muito mais altas e hoje o Brasil é considerado pelos EUA como um importante parceiro no desenvolvimento de relações multilaterais, dizem especialistas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi apenas o terceiro chefe de Estado a ser recebido pelo presidente americano Barack Obama, e o primeiro da América Latina, em um encontro sábado na Casa Branca.
Não há nenhum Fletcher hoje pressionando o governo americano a melhorar o relacionamento com o Brasil, mas o momento atual é favorável, segundo vários especialistas. Embora ainda ocorram embates sobre questões comerciais, há boas perspectivas de cooperação em áreas como combate ao tráfico de drogas, mudanças climáticas e relações multilaterais. O governo Obama também tem sinalizado um posicionamento mais flexível em relação a Cuba, o que provavelmente agradaria o governo Lula. Além disso, o Brasil é visto como um país que desfruta de boas relações na América Latina de maneira geral, o que pode ajudá-lo a servir de ponte para um novo diálogo entre os EUA e a região, dizem os especialistas. Após uma reunião com Lula sábado, Obama disse que pretende usar o relacionamento com o Brasil para reforçar os laços com a América Latina.
É claro que a grandiosidade da crise econômica nos EUA e no mundo, e os conflitos no Iraque e no Afeganistão podem dificultar que o governo de Obama dê prioridade à América Latina em sua agenda internacional num futuro próximo, diz o cientista político Riordan Roett, da Universidade Johns Hopkins. "A atitude atual é benigna, mas a escalada da violência no México, fruto da guerra contra o narcotráfico, o policiamento da fronteira com esse país e os efeitos da queda nas remessas de imigrantes devem ganhar mais destaque na agenda do governo Obama" em se tratando de relações com a América Latina, diz Roett, que recebeu em 2000 a medalha da Ordem de Rio Branco das mãos de Fernando Henrique Cardoso.
O convite de Obama para Lula visitar Washington também é um bom sinal, diz Roett, para quem a cooperação entre os dois países no contexto atual é muito mais abrangente do que as questões bilaterais, especialmente com o papel preponderante do Brasil na construção de mecanismos multilaterais. "Se Obama quiser ativar a Rodada Doha, vai precisar do Brasil." Brasil e EUA se reúnem novamente no início de abril, na conferência do G-20 em Londres, e em 17 de abril para a V Cúpula das Américas, em Port of Spain, Trinidad e Tobago.
Segundo Luiz Alberto Moniz Bandeira, professor aposentado de política exterior do Brasil da Universidade de Brasília, os dois países "não podem deixar de se considerar, (pois) são as duas maiores massas geográficas, demográficas e econômicas do continente".
Moniz aponta também a diminuição na importância dos EUA para as exportações brasileiras, que passaram a ser dominadas pela União Europeia e países emergentes. "O Brasil quer se aproximar dos EUA apenas na medida em que os EUA queiram se aproximar do Brasil", diz Moniz.
Em entrevista coletiva em 25 de fevereiro, logo após se reunir em Washington com Hillary Clinton, o chanceler Celso Amorim disse que uma prioridade para reativar as negociações multilaterais para o comércio mundial é a confirmação pelo Congresso do indicado para o cargo de representante comercial dos EUA, Ron Kirk. A nomeação ainda está pendente, enquanto pesam sobre Kirk questões relativas a sua declaração de renda.
"O diálogo entre os dois governos realmente evoluiu nos últimos anos e acredito que o governo Obama continuará desenvolvendo isso", diz Julia E. Sweig, diretora de estudos latino-americanos do Council on Foreign Relations, um centro de pesquisas que tem sede em Nova York e se descreve como não-partidário e independente. A política comercial entre os dois países, contudo, ainda "não foi bem resolvida". Embora haja muito interesse no Brasil, diz Sweig, especialmente em relação às recentes descobertas petrolíferas e à indústria do etanol, a falta de conhecimento aprofundado sobre o país pode ser um obstáculo para as relações entre os dois países. "O pessoal da política exterior (do governo Obama) está preocupado com México, Cuba e, em terceiro lugar, o Brasil. Mas ainda existe um grande déficit de conhecimento sobre o Brasil e como dialogar com o país em meio à classe política em Washington", diz.
Questões comerciais também se interpõem entre os dois países. Um dos pontos de debate é a tarifa de US$ 0,14 por litro de álcool combustível importado do Brasil nos EUA. Ela foi mantida na legislação agrícola aprovada em 2008 e está em vigor até o fim de 2010. A demanda por álcool combustível nos EUA vem crescendo, mas o país tem sua própria produção, à base de milho, e os produtores locais têm bastante influência em Washington.
"Barack Obama quer expandir a produção de energia renovável na América Latina de uma maneira que promova a auto-suficiência e crie mais mercados para fabricantes e produtores americanos de biocombustíveis", diz o plano para a América Latina divulgado ano passado pelo então candidato. Obama reafirmou sua posição ao dizer após a reunião com Lula que o etanol é um "tema tenso" entre os dois países, que não vai mudar de um dia para o outro.
Joel Velasco, representante-chefe para a América do Norte da União da Indústria de Cana-de-Açúcar do Brasil (Unica), tem esperança de que políticos contrários à tarifação apresentem novas emendas que modifiquem a legislação agrícola. Velasco diz que os senadores e deputados das regiões costeiras tendem a apoiar a redução da tarifa, já que não produzem etanol e geralmente são obrigados a pagar mais caro pelo produto. Ele cita como favoráveis à redução da tarifa os senadores republicanos Richard Lugar e Judd Gregg.
Representantes dos senadores confirmaram que eles apoiam a redução da tarifa, mas disseram que no momento não há planos de introduzir nova legislação. Gregg chegou a apresentar em junho do ano passado um projeto de lei para reduzir a tarifa para US$ 0,12 por litro, sob o argumento de que a medida baixaria o preço da gasolina — na época o barril de petróleo estava acima de US$ 140, enquanto agora flutua na casa dos US$ 40. O projeto acabou morrendo no Congresso.
Gregg tinha sido indicado para ocupar a Secretaria de Comércio, um cargo que vem rendendo dor de cabeça a Obama, mas acabou desistindo sob a alegação de que havia "diferenças irresolúveis" com a política do novo presidente. O cargo em questão ainda está vago e Obama indicou recentemente o ex-governador do Estado de Washington Gary Locke, que aguarda confirmação.
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