domingo, mayo 24, 2009

Entrvista con Marcos Aguinis

"Argentina está no caminho do inferno", diz ensaísta
Para Marcos Aguinis, 74, país antes "rico e culto" está hoje "em franca decadência"

Crítico do casal Kirchner diz que atual Casa Rosada deve "enfrentar consequência" do mau governo; livro vendeu 60 mil cópias em dois meses

THIAGO GUIMARÃES
DE BUENOS AIRES

Marcos Aguinis, 74, é hoje a voz da classe média na Argentina, que vive divórcio litigioso com o casal presidencial Cristina e Néstor Kirchner desde o início do conflito com o campo, há 14 meses, e às vésperas de eleições legislativas nas quais o segundo é candidato.

O último livro do ensaísta, "Pobre Patria Mia!" (editora Sudamericana), um autointitulado panfleto contra o legado da era Kirchner, vendeu 60 mil exemplares em dois meses.

Identifica uma Argentina "a caminho do inferno", que nas últimas décadas passou de "rica, culta e decente" a "pobre, mal educada e corrupta".

Golpista para setores que defendem o governo, Aguinis diz que os Kirchner devem enfrentar, no poder, as consequências de seus erros. Psicanalista e neurocirurgião, recebeu a Folha na última quinta-feira e expôs seu diagnóstico da "franca decadência" argentina.

FOLHA - Por que "Pobre Patria Mia"?

MARCOS AGUINIS - O livro retrata uma frustração de ver a Argentina desorientada e em franca decadência. Recuperamos a democracia em 1983, vivemos uma primavera por três anos, mas a decadência se manteve.

FOLHA - Pelo livro, o sr. foi tido como "escritor da Argentina destituinte". Quer que o governo se vá?

AGUINIS - Pelo contrário. Que fique e enfrente as consequências de seu mau governo. Falam em crescimento econômico "chinês", mas aumentou a pobreza, há decadência educacional, problemas em saúde, as favelas e o narcotráfico cresceram. Há aumento da anomia, com piquetes e bloqueios por todos os lados.

FOLHA - Como avalia a estratégia do governo, que adiantou a eleição e promove candidatos que não assumirão os cargos?

AGUINIS - É um desprezo à República, porque não dá valor ao Congresso como Poder independente, e uma degradação do ato eleitoral, como uma fraude anunciada. Aumenta a anomia, esse estado de confusão.

FOLHA - Qual é o legado dos anos Kirchner?

AGUINIS - Uma decadência, maior insegurança e rancor. Sociedade dividida, República derrubada, instituições débeis.

FOLHA - E onde os Kirchner foram bem?

AGUINIS - Melhorou a Corte Suprema de Justiça, a de [Carlos] Menem era muito ruim. Há quem diga que foi bom se livrar do FMI [Fundo Monetário Internacional], mas a dívida era a menor do fundo. Kirchner não queria inspeções porque nesse governo não há controles.

FOLHA - E a política de direitos humanos, com reabertura das causas da ditadura?

AGUINIS - É parcial e interessada, somente para processar crimes da ditadura de 30 anos atrás. Os direitos humanos no presente não são defendidos.

FOLHA - Néstor Kirchner diz que a estatização da previdência privada, em 2008, foi o feito mais importante desde 2003, e o sr. afirma que é um "ato de vampirismo".

AGUINIS - Ele usa hoje esse dinheiro para manter uma tradição horrível argentina, que começou com [Juan Domingo] Perón: usar o dinheiro dos aposentados para outros fins. Há gente que decidiu pôr seu dinheiro ali porque não confia que o Estado lhe pague uma aposentadoria justa.

FOLHA - Por que o governo perdeu apoio da classe média?

AGUINIS - Demonstra que o governo não é popular. Está ensimesmado em obter poder e promover capitalismo de amigos. A classe média percebeu.

FOLHA - O governo é respaldado pelos setores mais pobres da sociedade. Não é um sinal de que fez algo por essas pessoas?

AGUINIS - O respaldo vem sobretudo da Grande Buenos Aires, onde estão os mais pobres, que vivem de subsídios. Esse dinheiro deixou de ser ajuda de emergência e se converteu em suborno crônico.

FOLHA - A morte do presidente Raúl Alfonsín levou milhares às ruas em março. Como analisou esses atos e o chamado "efeito Alfonsín", que beneficiaria a oposição?

AGUINIS - Nas homenagens a Alfonsín não se falava de sua gestão, mas de sua conduta: que não era ladrão, não era orgulhoso, não chamava de inimigo a quem pensa diferente, um homem do diálogo e da lei. O povo argentino quer isso, e é o que os Kirchner violaram. É uma clara mensagem antikirchnerista.

FOLHA - A oposição está preparada para ser uma opção de poder?

AGUINIS - O governo Cristina vai caminhar melhor se perder a maioria

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